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19 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Tribunal de Justiça do Ceará TJ-CE - Apelação: APL XXXXX-92.2018.8.06.0001 CE XXXXX-92.2018.8.06.0001 - Inteiro Teor

Tribunal de Justiça do Ceará
há 5 anos

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

1ª Câmara Direito Privado

Publicação

Julgamento

Relator

VERA LÚCIA CORREIA LIMA

Documentos anexos

Inteiro TeorTJ-CE_APL_01116889220188060001_87dc0.pdf
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Inteiro Teor

ESTADO DO CEARÁ

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA

GABINETE DA DESEMBARGADORA VERA LÚCIA CORREIA LIMA

Processo: XXXXX-92.2018.8.06.0001 - Apelação

Apelantes/Apelados: Guiomar Correa de Andrade e Bradesco Saúde S/A

Custos legis: Ministério Público Estadual

DECISÃO MONOCRÁTICA

Cuido das Apelações de fls. 387/393 e 394/415 interpostas contra a sentença de fls. 370/393, prolatada pelo douto Juízo da 3ª Vara Cível da Comarca de Fortaleza, que ratificou a decisão liminar proferida nos autos da Ação Declaratória de Nulidade de Cláusula Contratual cumulada com Repetição de Indébito e Pedido de Tutela Antecipada interposta por Guiomar Correa de Andrade em face do Bradesco Saúde S/A.

Explica-se.

Na exordial de fls. 01/11, a Demandante relata que: é titular de contrato junto ao Promovido desde 1997, na modalidade de plano de saúde individual; sempre foi pontual no pagamento das mensalidades; o Requerido vem impondo aumentos abusivos, porquanto extrapolam os limites autorizados pela ANS; a contraprestação que em agosto de 2014 custava R$ 3.734,17 (três mil, setecentos e trinta e quatro reais e dezessete centavos), em novembro de 2017 foi majorada para R$ 7.277,57 (sete mil, duzentos e setenta e sete reais e cinquenta e sete centavos), revelando-se excessivo o aumento de 100% (cem por cento) no intervalo de 03 (três) anos.

Salienta, ainda, que, ao buscar informações sobre os

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mencionados ajustes, o Requerido informou que aplicou os subitens 17.1, 17.2 e 17.3 do contrato, que estabelecem o reajuste anual (decorrente das Variações dos Custos Médicos Hospitalares), reajuste por mudança de faixa etária (que dispõe de uma tabela com os respectivos índices) e reajuste anual por mudança de faixa etária (de 5% por mudança de idade).

Pugnou, assim, no sentido de ser declarada "(...) nula a cláusula que determina a aplicação de reajuste ao contrato da Requerente de forma anual e de faixa etária, bem como condenar a Requerida a devolver em dobro os valores indevidamente cobrados, a serem apurados após a apresentação de histórico financeiro, mas até aqui considerados em R$ 74.518,06 (setenta e quatro mil, quinhentos e dezoito reais e seis centavos), devendo, portanto, estes valores ser devolvidos em dobro, no valor de R$ 149.036,12 (cento e quarenta e nove mil e trinta e seis reais e doze centavos), devendo, ainda ser a Requerida condenada ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), tendo em vista o imenso dano financeiro sofrido por uma idosa" (fl. 11).

O Magistrado a quo decidiu nos seguintes termos:

"(...) Analisando a pretensão autoral, sob uma visão prática, (portanto, observando apenas as alegações das partes, sem avaliar as provas ou o direito aplicável), constato que a mensalidade de plano objeto desta ação passou de R$ 3.599,32 (em 2014) para R$ 7.277,57 (em 2017). Com efeito, essa aplicação viola os princípios constitucionais da

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razoabilidade e da proporcionalidade, bem como quebranta os princípios contratuais da boa-fé objetiva, da confiança, da lealdade, do equilíbrio contratual, pelo fundamento de que houve um acréscimo inimaginável de 100% em um período de apenas 3 anos em um país onde o nosso ambiente social, político e econômico não disponibiliza nenhuma situação de inflação desmedida que justifique uma readequação violenta de preço, principalmente em serviço de natureza essencial, com o dos autos.

Além disso, observo que essa forma de revisão presume comprometer quase que totalmente a renda da promovente, pois, embora ausente de comprovação, referida renda não deve ser elevada, posto que a requerente se qualifica como pessoa do lar (não contrariado pelo requerido), sendo que não é comum imaginar que uma pessoa sem profissão definida tenham renda bruta superior à R$ 7.000,00 para gastar exclusivamente com plano de saúde, visto que rendas desse alcance se restringem a pouco mais de 10% dos cidadãos cearense, e ainda que a renda seja elevada, não há como se imaginar uma majoração dos rendimentos em idêntica proporção para fins de compensação de gastos e equilíbrio das finanças para as demais necessidades sociais.

Mas, superada essas colocações, e efetuando uma análise detida do caso, constato que o requerido utilizou 3 fatores de

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correção do plano de saúde do requerente, da seguinte forma: (1) Reajuste anual, decorrente das Variações dos Custos Médicos Hospitalares, (2) Reajuste por mudança de faixa etária, que dispões de uma tabela com os respectivos índices e (3) Reajuste anual por mudança de faixa etária, de 5% de seu valor por mudança de idade.

Observando esses critérios, entendo que o primeiro reajuste (o anual) mostra-se juridicamente aceitável, sob a razão de que a aplicação anual das variações de custos médico hospitalares representa uma forma de gerenciar as despesas do serviço de saúde, de modo a garantir o equilíbrio do próprio sistema. Na prática, vejo que o requerido demonstrou uma aplicação anual de 10,79% (pág. 285), o que se aproxima de fatores como a inflação, passível de aceitação.

Entretanto, o segundo reajuste (o por mudança de faixa etária) vai de encontro com toda uma política dominante e vigente de proteção ao idoso, firmadas pelo Poderes Legislativo e aplicada pelo Poder Judiciário, tendo em vista que violam frontalmente os princípios contratuais e constitucionais anteriormente elencados, notadamente porque o requerente já pagava uma prestação muito elevada de plano de saúde e se firmou critérios de revisão de mudança de faixa etária muito abusivo, pois, conforme subitem do contrato 17.2 (pág. 285), a ultima revisão operada pelo autor ocasionaria o aumento de

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46,73%.

Igualmente indevido é o terceiro reajuste (o anual por mudança de faixa etária) constante no subitem 17.3 (pág.285), visto que proporciona aumento anual e constante de 5%, sendo que esse aumento anual já se encontra regulado por um índice de reajuste anual, o que o tornaria repetitivo.

Sob esse contexto, tenho a compreensão de a postura do requerido, em aplicar uma majoração de mensalidade fundada nessa base abusiva (avanço de idade) cumulada com outra (revisão anual) viola a execução do próprio contrato, pela razão de que, ao firmar o pacto com o requerente em tempo passado (1997), não havia aplicações tão drásticas de revisão de mensalidade, o que causava no requerente a sensação de custeio sem empecilhos deste serviço prioritário, contudo, atualmente, essas majorações geram-me a visão de temor demonstrado pelo requerente, visto que o medo em não poder disponibilizar os recurso financeiros para custear o plano de saúde (que, diga-se, representa algo essencial) pode causar doenças ou mesmo agravar as debilidades então existentes, pois as distorções psíquicas para eventos dessa espécie podem gerar os fatos acima elencados.

Por certo, essa assertiva poderia levar ao requerido imaginar que o requerente tinha a liberdade de aderir ao plano de saúde

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de outra operadora que não empregasse os critérios aqui combatidos, contudo penso que o principal fator não é o acero ou erro de escolha feita pelo paciente, mas a questão dominante é combater o abuso de quem está exigindo aumento exorbitante em mensalidade no critério avanço da idade.

À vista dessas circunstâncias, compreendo que, dos critérios de aumento da prestação mensal do plano de saúde disponibilizado pelo requerido em prol do requerente, os que são ligados à mudança de faixa etária não são passíveis de guarida porque, embora estejam previstos no contrato, revelam-se desarrazoados e ainda causam oneração excessiva ao consumidor, o que resulta na legitimidade de sua anulação, de modo que a exclusão dessas cláusulas garantem, acima de tudo, a sobreposição do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, em seus aspectos de humanidade, prioridade e aplicabilidade.

Quanto à repetição de indébito, o art. 42, parágrafo primeiro, do CDC estabelece que a cobrança de parcelas indevidas gera o dever de restituição em dobro.

Contudo, a jurisprudência interpretou que essa penalidade -restituição em dobro - deve sopesar se houve comprovação de má-fé do requerido, pois do contrário haveria enriquecimento

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sem causa do promovente. A propósito, o Supremo Tribunal Federal: Súmula 159. Cobrança excessiva, mas de boa-fé, não dá lugar às sanções do art. 1.531 do Código Civil.

Impende ressaltar que a súmula acima refere-se ao Código Civil de 1916, sendo que o Novo Código Civil conservou, no art. 940, praticamente intacto o texto da antiga norma, mantendo-se referida aplicação. (...)

Na espécie, verifico que existiu cobrança indevida, entretanto deve-se proceder a restituição de forma simples porque não restou comprovada a má-fé do demandado, precipuamente porque a aplicação dessa regra possuia ampla diversidade de entendimento, e também porque estou, neste processo, dirimindo uma dúvida, e não punindo uma conduta.

Quanto aos danos morais, na hipótese, denota-se que o requerente (1) sofreu a situação constrangedora pela incidência de revisões de um plano de saúde que causaram cobrança excessiva da mensalidade, ficando presumido o receio do paciente em não conseguir atender os custos exigidos e poder sofre necessidade inadiáveis e (2) não demonstrou suas condições financeiras ou informações que possibilitem sabermos sua renda.

De outro lado, percebe-se que a requerida (3) é uma empresa

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de médio porte, presumindo dispor de uma razoável patrimônio financeiro e (4) dever aplicar uma política mais adequada para a fixação da mensalidade nos planos de saúde, sendo que a presente decisão possa ser um estímulo para excluir do seus pacto as referências ligadas à idade tão abusivas e não cumulativas para firmar os reajustes.

Assim, considero adequada a fixação da reparação de danos morais em valor que entendo não ser irrisório, muito menos exorbitante, mas atendendo aos parâmetros da razoabilidade e proporcionalidade, na quantia de R$ 10.000,00 (dez mil reais).

POR TODO O EXPOSTO, ratifico a decisão liminar de págs. 271/274 e julgo parcialmente procedente a ação para, no plano de saúde ofertado pelo requerido em proveito do requerente, (I) declarar válido o reajuste anual (decorrente das Variações dos Custos Médicos Hospitalares - subitem 17.1 do contrato), (II) declarar nulo os reajustes por mudança de faixa etária e reajuste anual por mudança de faixa etária (fixados nos subitens 17.2 e 17.3 do pacto), (III) condenar o requerido à restituir ao requerente os valores indevidamente pagos quanto a cobrança excessiva dessa revisão da mensalidade, de forma simples, acréscimo de correção monetária pelo INPC e de juros moratórios de 1% a.m., com incidência a partir da data da propositura da ação, a ser apurado em sede de cumprimento de sentença e (IV) condenar o requerido a pagar o requerente

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a reparação dos danos morais, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), acréscimo de correção monetária pelo INPC e de juros de 1% a.m., com incidência a partir deste arbitramento, conforme inteligência das súmulas 43, 54 e 362 do STJ.

Considerando a sucumbência recíproca (art. 86 do NCPC) e que os honorários sucumbenciais não são passíveis de compensação (art. 85, § 14 do NCPC), e ainda, que o pedido foi acolhido em parte proporcional, condeno o requerente a pagar 50% das custa processuais e honorários sucumbenciais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), conforme art. 85, § 8º, do NCPC, acrescidos de correção monetária pelo INPC e de juros moratórios de 1% a.m., com incidência a partir do trânsito em julgado da decisão (art. 85, § 16, do NCPC), cuja exigibilidade ficará suspensa em razão da gratuidade judiciária deferida, conforme o disposto no art. 98, § 3º, do NCPC, enquanto que condeno o requerido a pagar 50% das custa processuais e honorários sucumbenciais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), conforme art. 85, § 2º, do NCPC, sendo, acrescidos de correção monetária pelo INPC e de juros moratórios de 1% a.m., com incidência a partir do trânsito em julgado da decisão (art. 85, § 16, do NCPC).Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Transitada em julgado, arquivem-se os autos, com baixa na distribuição".

Nas suas razões de fls. 387/393, a Autora Guiomar Correa de

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GABINETE DA DESEMBARGADORA VERA LÚCIA CORREIA LIMA Andrade pleiteia a reforma da sentença quanto à repetição do indébito, para que seja determinada a devolução em dobro do valor que pagou a maior ao Demandado, além do arbitramento dos honorários sucumbenciais no percentual entre 10% e 20% sobre o valor da condenação.

Por outro lado, o Promovido Bradesco Saúde S/A, na Apelação de fls. 394/415, discorre acerca da legalidade da previsão contratual dos reajustes, afirmando ainda que não houve dano moral suportado pela Demandante, razão pela qual requer a modificação do julgado em todos os seus termos.

Contrarrazões às fls. 422/433.

Instado a se manifestar, o Ministério Público opinou pelo conhecimento e improvimento dos Recursos, nos termos do parecer de fls. 441/448.

Vieram os autos em conclusão.

É o que basta relatar.

Passo a decidir.

Inicialmente, justifico a atuação em caráter isolado a partir da racionalidade dos arts. 12, § 2º, inciso IV, e 932, inciso IV, do CPC, assim redigidos:

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"Art. 12. Os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão. (Redação dada pela Lei nº 13.256, de 2016) (...)

§ 2o Estão excluídos da regra do caput:(...)

IV - as decisões proferidas com base nos arts. 485 e 932;"

"Art. 932. Incumbe ao relator:

(...)

IV negar provimento a recurso que for contrário a:

a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal;

b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;

c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência;" [grifei].

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A doutrina específica sobre o citado dispositivo confere-lhe a seguinte interpretação:

"O relator pode negar provimento ao recurso liminarmente quando esse for contrário a precedentes das Cortes Supremas (art. 932, IV, a e b, CPC). Note-se que a alusão do legislador a súmulas ou a casos repetitivos constitui apenas um indício

não necessário e não suficiente a respeito da existência ou não de precedentes sobre a questão que deve ser decidida. O que interessa para incidência do art. 932, IV, a e b, CPC, é que exista precedente sobre a matéria que pode ou não estar subjacente a súmulas e pode ou não decorrer do julgamento de recursos repetitivos. O relator também pode negar provimento ao recurso invocando jurisprudência vinculante das Cortes de Justiça que depende de se encontrar sumulada (art. 932, IV, a, in fine, CPC) ou de ter sido gerada a partir da forma específica dos incidentes de resolução de demandas repetitivas e de assunção de competência (art. 932, IV, c, CPC). O que se procura prestigiar com a possibilidade de o relator negar provimento ao recurso é a força vinculante dos precedentes e da jurisprudência sumulada ou decorrente de julgamentos dos incidentes próprios." (in: Novo código de processo civil comentado/Luiz Guilherme Marinoni. Sérgio Cruz Arenhart. Daniel Mitidiero São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 2015, p. 879/880).

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Assim, antecipo que estou conhecendo das Apelações, posto que presentes seus pressupostos admissionais, e improvendo os Recursos.

A controvérsia cinge-se à análise acerca da regularidade do reajuste da mensalidade do plano de saúde em razão da faixa etária.

Registra-se que há relação de consumo entre as partes, representada pelo contrato de plano de saúde, sujeitando-se a hipótese às regras do Código de Defesa do Consumidor.

Assinala-se o teor da Súmula 469 do STJ:

"Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde".

No ensejo da causa de pedir recursal, como reforço argumentativo, anoto, dado o oportuno momento, que o Estatuto do Idoso, norma cogente e de ordem pública, veda a cobrança discriminatória de mensalidades de planos de saúde em razão da idade. Veja-se:

"Art. 15. É assegurada a atenção integral à saúde do idoso, por intermédio do Sistema Único de Saúde - SUS, garantindolhe o acesso universal e igualitário, em conjunto articulado e contínuo das ações e serviços, para a prevenção, promoção, proteção e recuperação da saúde, incluindo a atenção especial às doenças que afetam preferencialmente os idosos.

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§ 3º É vedada a discriminação do idoso nos planos de saúde pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade."

Passadas as considerações iniciais, avanço ao mérito da decisão.

Sobre a questão em debate, o Superior Tribunal de Justiça firmou no REsp nº 1.568.244/RJ, processado sob o rito dos recursos repetitivos, entendimento no sentido de admitir reajuste da prestação do plano de saúde por mudança de faixa etária, desde que observados os seguintes parâmetros:

"(i) a expressa previsão contratual; (ii) não serem aplicados índices de reajuste desarrazoados ou aleatórios, que onerem em demasia o consumidor, em manifesto confronto com a equidade e as cláusulas gerais da boa-fé objetiva e da especial proteção ao idoso, dado que aumentos excessivamente elevados, sobretudo para esta última categoria, poderão, de forma discriminatória, impossibilitar a sua permanência no plano; e (iii) respeito às normas expedidas pelos órgãos governamentais:

a) No tocante aos contratos antigos e não adaptados, isto é, aos seguros e planos de saúde firmados antes da entrada em vigor da Lei nº 9.656/1998, deve-se seguir o que consta no contrato, respeitadas, quanto à abusividade dos percentuais de aumento, as normas da legislação consumerista e, quanto

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à validade formal da cláusula, as diretrizes da Súmula Normativa nº 3/2001 da ANS.

b) Em se tratando de contrato (novo) firmado ou adaptado entre 2/1/1999 e 31/12/2003, deverão ser cumpridas as regras constantes na Resolução CONSU nº 6/1998, a qual determina a observância de 7 (sete) faixas etárias e do limite de variação entre a primeira e a última (o reajuste dos maiores de 70 anos não poderá ser superior a 6 (seis) vezes o previsto para os usuários entre 0 e 17 anos), não podendo também a variação de valor na contraprestação atingir o usuário idoso vinculado ao plano ou seguro saúde há mais de 10 (dez) anos.

c) Para os contratos (novos) firmados a partir de 1º/1/2004, incidem as regras da RN nº 63/2003 da ANS, que prescreve a observância (i) de 10 (dez) faixas etárias, a última aos 59 anos; (ii) do valor fixado para a última faixa etária não poder ser superior a 6 (seis) vezes o previsto para a primeira; e (iii) da variação acumulada entre a sétima e décima faixas não poder ser superior à variação cumulada entre a primeira e sétima faixas."

Assim, a variação das contraprestações pecuniárias dos planos privados de assistência à saúde em razão da idade do usuário deverá estar prevista no contrato, de forma clara, bem como todos os grupos etários e os percentuais de reajuste correspondentes.

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Na espécie, como bem ponderado pelo Magistrado a quo, verificase que o Requerido utilizou 3 (três) fatores de correção, quais sejam: (1) Reajuste anual, decorrente das Variações dos Custos Médicos Hospitalares, (2) Reajuste por mudança de faixa etária, que dispõe de uma tabela com os respectivos índices e (3) Reajuste anual por mudança de faixa etária, de 5% de seu valor por mudança de idade.

O reajuste anual (10,79% - fl. 285) mostra-se juridicamente válido, porquanto a aplicação anual das variações de custos médicohospitalares representa uma forma de gerenciar as despesas do serviço de saúde, de modo a garantir o equilíbrio do próprio sistema.

Contudo, o segundo reajuste (por mudança de faixa etária) viola a boa fé contratual e a razoabilidade, posto que o Requerente já pagava uma prestação muito elevada, a qual foi revisada de forma abusiva, pois, conforme o subitem 17.2 (fl. 285) do contrato, a última revisão operada ocasionaria o aumento de 46,73%.

Igualmente indevido é o terceiro reajuste (anual por mudança de faixa etária) constante no subitem 17.3 (fl. 285), visto que proporciona majoração anual e constante de 5%, mostrando-se repetitivo diante do já existente reajuste anual.

Portanto, merece acolhida a pretensão de reconhecimento da abusividade dos reajustes decorrentes de mudança de faixa etária, os quais deverão atender aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, além de

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todos os primados contidos no Código de Defesa do Consumidor, conforme entendimento do STJ em sede do recurso repetitivo suso mencionado ( REsp XXXXX/RJ).

A propósito, o Superior Tribunal de Justiça possui entendimento no sentido de que, nos contratos desta natureza, quando firmados ao longo de muitos anos, o aumento da mensalidade por faixa etária não é juridicamente aceito. Senão, vejamos:

"PROCESSO CIVIL. CIVIL. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RECURSO MANEJADO SOB A ÉGIDE DO NCPC. CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE COLETIVO EMPRESARIAL. REAJUSTE DE MENSALIDADE UNICAMENTE EM VIRTUDE DA MUDANÇA DE FAIXA ETÁRIA APÓS OS SESSENTA ANOS. IMPOSSIBILIDADE. CONTRATO CELEBRADO ANTERIORMENTE À VIGÊNCIA DO ESTATUTO DO IDOSO. IRRELEVÂNCIA. NULIDADE DE CLÁUSULA. PRECEDENTES DO STJ. RECURSO MANIFESTAMENTE INADMISSÍVEL. INCIDÊNCIA DA MULTA DO ART. 1.021, § 4º, DO NCPC. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. O presente agravo interno foi interposto contra decisão publicada na vigência do NCPC, razão pela qual devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma nele prevista, nos termos do Enunciado Administrativo nº 3, aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016: Aos

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recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC. 2. A cláusula que estabelece o aumento da mensalidade do plano de saúde, de acordo com a faixa etária, mostra-se abusiva após o beneficiário complementar 60 anos de idade e se tiver mais de 10 anos de vínculo contratual. Precedentes. 3. A operadora do plano de saúde não apresentou argumento novo capaz de modificar a conclusão adotada, que se apoiou em entendimento aqui consolidado para negar provimento ao seu recurso especial. 4. Em virtude do não provimento do presente recurso, e da anterior advertência quanto a aplicação do NCPC, incide ao caso a multa prevista no art. 1.021, § 4º, do NCPC, no percentual de 3% sobre o valor atualizado da causa, ficando a interposição de qualquer outro recurso condicionada ao depósito da respectiva quantia, nos termos do § 5º daquele artigo de lei. 5. Agravo interno não provido, com imposição de multa. (STJ, AgInt nos EDcl no AREsp XXXXX/RS, Relator: Ministro Moura Ribeiro, Data do Julgamento: 05/06/2018)." [grifei]

No mesmo sentido, colho Jurisprudência do egrégio Tribunal de

Justiça do Estado de Ceará:

"AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONTRATO DE PLANO DE

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SAÚDE. REAJUSTE DE MENSALIDADE. FAIXA ETÁRIA. USUÁRIO IDOSO VINCULADO AO PLANO HÁ MAIS DE 10 ANOS. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO IMPROVIDO. 1. A decisão guerreada foi proferida de forma escorreita e de acordo com o entendimento pacificado da Corte Cidadã, o qual dispõe que não pode a variação de valor na contraprestação atingir o usuário idoso vinculado ao plano ou seguro-saúde há mais de 10 (dez) anos, sendo este, aparentemente, o caso dos autos. 2. O plano da parte autora é o UNIVIDA -9000 com acomodação em enfermaria, o qual prevê, em caso de mudança para a última faixa etária, um reajuste de 90,50% (noventa vírgula cinquenta por cento), em consonância com a Cláusula de nº 13 do pacto. Entrementes, mostra-se, nesta fase processual, abusiva a forma de reajuste imposta a recorrida, eis que a sua única opção seria a sua saída do plano por não conseguir suportar o adimplemento das contribuições. 3. Assim, parece-me que o Julgador a quo agiu com acerto ao determinar que a agravante aplique o índice de reajuste de 13.55%, até ulterior deliberação daquele Juízo. 4. Recurso improvido. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 2ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer do recurso, mas para negar-lhe provimento, nos termos do voto do relator. Fortaleza, 23 de maio de 2018 CARLOS ALBERTO MENDES FORTE Presidente do Órgão Julgador DESEMBARGADOR CARLOS ALBERTO MENDES FORTE

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Relator (Relator (a): CARLOS ALBERTO MENDES FORTE;

Comarca: Fortaleza; Órgão julgador: 33ª Vara Cível; Data do julgamento: 23/05/2018; Data de registro: 23/05/2018)" [grifei]

Destarte, deve ser coibido reajuste que impeça ou dificulte a permanência do segurado no plano de saúde.

É o que se verifica da leitura do art. 39, inciso V do CDC, in verbis:

"Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: (...)

V - exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva;"

Com efeito, aumento da cobrança em montante de quase 100% vai de encontro à boa-fé objetiva exigida dos sujeitos das relações contratuais.

E a função da boa-fé objetiva é a de servir como causa limitadora da conduta, reduzindo a liberdade de atuação dos contratantes, seja controlando a transferência dos riscos profissionais para o consumidor ou liberando-o em face da não razoabilidade de outra conduta. É uma função negativa, pois proíbe os contratantes de estabelecerem livremente o conteúdo do contrato ou de exercerem ilimitadamente os direitos dele advindos, através da imposição de um novo modelo de atuação não abusiva, baseado em valores de lealdade, confiança e respeito mútuo.

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Por conseguinte, o percentual praticado colide com a proteção consumerista ao violar o princípio da boa-fé objetiva e ao frustrar as legítimas expectativas da Autora, onerando-a demasiadamente

Com efeito, o reajuste deve se dar de forma leal, equilibrada e transparente, em justa homenagem ao princípio geral de direito da boa-fé objetiva e do dever de informar, notadamente no que diz respeito aos custos e respectivos cálculos que teriam acarretado o reajuste das mensalidades, sendo vedada sua aplicação desarrazoada, prevendo contraprestação exagerada.

No que tange à repetição de indébito, o art. 42, parágrafo primeiro, do CDC estabelece que a cobrança de parcelas indevidas gera o dever de restituição em dobro.

No entanto, a jurisprudência entendeu que a restituição em dobro deve basear-se na comprovação de má-fé do Requerido. Neste sentido, o Supremo Tribunal Federal:

"Súmula 159. Cobrança excessiva, mas de boa-fé, não dá lugar às sanções do art. 1.531 do Código Civil."

In casu, existiu cobrança indevida, mas a restituição deve acontecer de forma simples, porquanto não comprovada a má-fé do Demandado, principalmente porque a aplicação desta regra possui ampla diversidade de entendimento, como bem ressaltado pelo Juízo de origem.

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Quanto aos danos morais, o fundamento da responsabilidade, na situação em epígrafe, é objetivo, ao passo que retrata hipótese de responsabilização civil do fornecedor de serviços por fato/defeito do serviço, diante de conduta abusiva que veio a frustrar a legítima expectativa do consumidor.

Para a dosimetria do valor de reparação deste dano, por se tratar de aspectos objetivos, notadamente porque o resultado econômico exige uma referência exata, a Jurisprudência estabeleceu como critérios cumulativos: o bem jurídico lesado, as condições econômico-financeiras do ofensor e do ofendido, o grau de reprovabilidade da conduta e a vedação do enriquecimento sem causa da vítima.

Neste contexto, denota-se que a Requerente sofreu a situação constrangedora pela incidência de revisões de um plano de saúde que causaram cobrança excessiva da mensalidade, ficando presumido o receio da paciente em não conseguir atender os custos exigidos, ao passo que o Requerido é uma empresa de médio porte, presumindo dispor de um razoável patrimônio financeiro.

A este respeito, é direito básico do consumidor lesado a efetiva prevenção e reparação individual de danos patrimoniais e morais, conforme art. , VI, do CDC.

No que tange ao quantum indenizatório, evidenciado pela intensidade dos transtornos causados e pela condição socioeconômica do

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Plano de Saúde promovido, mostra-se razoável a fixação do montante de R$ 10.000,00 (dez mil reais), que cumpre, no presente caso, a função pedagógicopunitiva de desestimular a Empresa ofensora a repetir a falta, sem constituir, de outro lado, enriquecimento indevido.

Por fim, considerando a sucumbência recíproca (art. 86 do NCPC) e que os honorários sucumbenciais não são passíveis de compensação (art. 85, § 14 do NCPC), e ainda, que o pedido foi acolhido em parte proporcional, a fixação dos honorários sucumbenciais no importe de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) para cada uma das partes, conforme art. 85, § 8º, do NCPC, acrescidos de correção monetária pelo INPC e de juros moratórios de 1% a.m., foi razoável e adequada ao caso.

Diante do exposto, escoltada pela inexorável Jurisprudência que ampara o presente decisum, conheço dos Recursos em apreço para negarlhes provimento, mantendo a decisão a quo em todos os seus termos.

Transcorrido in albis o prazo recursal, arquive-se.

Expedientes necessários.

Fortaleza, 14 de agosto de 2019.

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Relatora

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